Bento Domingues, OP, “Semana das Alianças Malditas”

25.03.2013

É importante desfazer um equívoco grave, para não se cair numa interpretação que nega o próprio sentido das narrativas e das cristologias do Novo Testamento. Supõe-se que esses textos foram escritos para afirmar privilégios e fundar um povo, uma Igreja de privilegiados: Cristo é único e é nosso; se o quiserem encontrar têm de passar por nós!

O que é particular à pessoa de Jesus, a sua absoluta característica, não tem nada a ver com esse equívoco: Jesus, na sua prática histórica, remete para um Deus que não é propriedade privada nem Dele nem de ninguém. É o Deus do livre amor por todos os seres humanos, sem restrição. O Deus de Jesus também não pode ser privatizado nem sequer pelos cristãos. Por outro lado, Jesus, na sua prática histórica, surge polarizado por todos os seres humanos, sejam ou não povo de Israel. É a partir da periferia que caminha para o centro. Tudo e em tudo, dentro e fora das religiões, só tem sentido se fôr para o bem de toda a humanidade.

Quaresma VI

24.03.2013

Deus mostra-se tal como a Sua Verdade disse: Quem me ama estará comigo e eu com eles, e hei-de mostrar-me a eles e faremos juntos uma morada. Assim é entre amigos muito queridos. O seu afecto amoroso faz deles dois corpos com uma alma, porque o amor transforma-nos no que amamos. E se estas almas se fazem numa alma com Deus, nada poderá ser escondido delas. É por isso que a Verdade de Deus disse, Virei e faremos uma morada juntos.

S. CATARINA DE SENA, OP, O Diálogo

Não Ouvir

23.03.2013

Pai Poemen disse, “o início do mal é não ouvir”.

Ditos dos Padres do Deserto

O Desejo que Nos Faz Viver

21.03.2013

não se extinga o desejo que nos faz viver,
Deus do nosso desejo

alimenta em nós o fogo das paixões
que nos leva a agir
e o fogo da palavra que por dentro queime
e faça escuta

tu que és o guardião do nosso desejo,
aviva a chaga que o nosso imaginário
constantemente quer sem falha;
que vivamos o nosso desejo sem culpabilidade

circuncide-nos o coração a espada do amor,
pregão antigo e novo
em nosso corpo adormecido e acordado

JOSÉ AUGUSTO MOURÃO, OP, “Do desejo”

Bento Domingues, OP, “Economia do Bem Comum”

18.03.2013

Na Doutrina Social da Igreja (DSI), o tema do bem comum é incontornável. Para João Paulo II, constituía mesmo o seu ponto-chave.

Para Friedrich A. Hayek, o bem comum é um conceito primitivo que remonta aos instintos ancestrais de tribos de caçadores, no tempo em que as pulsões colectivistas dominavam a consciência humana.

Ao contrário deste célebre autor, a noção de justiça social e de bem comum têm outras fontes, bíblicas e greco-romanas, alimentadas por alguns Padres da Igreja. Tomás de Aquino, na linha de Aristóteles, deu a este conceito a função de princípio da sua arquitectura ético-política.

Já Sto Agostinho via que a questão social não se resolve com falsos elogios à caridade: “não devemos desejar que haja indigentes para poder exercitar as obras de caridade. Dás pão ao faminto, mas melhor seria que ninguém passasse fome e não fosse necessário socorrer ninguém. […] Todas estas acções são motivadas pela misericórdia. Esquece, porém, os indigentes e logo cessarão as obras de misericórdia; mas acaso se extinguirá a caridade? Mais autenticamente amas o homem feliz a quem não há necessidade de socorrer; mais puro será este amor e muito mais sincero. Porque, se socorres o necessitado, desejas elevar-te acima dele e que ele te fique sujeito, porque recebe de ti um benefício. O necessitado, tu o ajudaste por isso te crês como superior aquele a quem socorreste”.

Quaresma V

17.03.2013

A criatura, isto é, toda a Igreja, espera ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus, isto é, aqueles que são filhos de Deus pela fé na Igreja esperam a glória, onde contemplarão Deus face a face. Agora contemplam-no como que velado, porque o contemplam em espelho e em enigma. A criatura está sujeita à vaidade, ou seja, à mutabilidade. Porque o justo, no dizer de Salomão, cai ao dia sete vezes, não por querer, pois não tem pecado na vontade. A este, justo, foi dito: Vai e não voltes a pecar. Sofre esta mutabilidade pacientemente quem faz penitência por amor de Deus, que o sujeitou, isto é, que quis sujeitar-se ou permitiu ser sujeito. E isto com a esperança da vida eterna, sobre a qual se ajunta: E também a criatura será livre de sujeição desta corrupção e mutabilidade, transformada na liberdade gloriosa dos filhos de Deus.

S. ANTÓNIO DE LISBOA, OFM, Sermões Dominicais

É Possível uma Teologia da Libertação Hoje, em Portugal?

13.03.2013

O Convento de São Domingos em Lisboa propõe um curso livre sobre a espiritualidade latino-americana da libertação. Uma Fé Libertadora: É Possível uma Teologia da Libertação Hoje, em Portugal? será leccionado pelo frade dominicano e mestre Zen Rui Manuel Grácio das Neves, autor dos livros Utopía y resistencia: Hacia una teopoética de la liberación (Salamanca: Editorial San Esteban, 1994) e Mística e Revolução: Espiritualidade, Poesia e Ensaio para um Novo Milénio (Arrimal: CEPSE, 2012), entre outros. Mais informações aqui.

Quaresma IV

10.03.2013

Ó Filho de Deus e Senhor meu! Como é que nos dás tantos bens juntos logo na primeira palavra? [...] Como nos dás, em nome do teu Pai, tudo o que se pode dar, pois queres que nos tenha como filhos? Porque a tua palavra não pode falhar. Obrigas a que a cumpra, o que não é pequena carga, pois que sendo Pai sofre connosco, seja qual for a gravidade das nossas ofensas. Se voltarmos para Ele, Ele há-de nos perdoar como ao filho pródigo, há-de nos confortar nas nossas provações, e há-de nos sustentar como deve fazer tal Pai — que forçosamente tem de ser melhor do que todos os pais deste mundo, porque n’Ele não pode haver senão todo o bem cumprido — e depois de tudo isto fazer-nos participantes e herdeiros com Vós.

S. TERESA DE JESUS, OCD, Caminho de Perfeição

Mostra-me

06.03.2013

Faz parte de uma das leituras da Liturgia das Horas de hoje, assinada pelo bispo Teófilo de Antioquia, do século II:

Se tu me dizes: “Mostra-me o teu Deus”, eu posso responder-te: “Mostra-me o homem que há em ti, e eu te mostrarei o meu Deus.” Mostra-me, portanto, como vêem os olhos da tua mente e como ouvem os ouvidos do teu coração.

Bento Domingues, OP, “Não Basta um Novo Papa”

05.03.2013

Seria um abuso responsabilizar S. Pedro pela história do papado e pela sua configuração actual. Segundo parece, o primeiro Bispo de Roma a ser chamado Papa, foi João I, no séc. VI, embora fosse um termo do vocabulário cristão, de carinho pelos pastores das comunidades.

Nas circunstâncias actuais, nos limites da escolha de um novo Papa, seria desejável ver alguém eleito disposto a fazer uma reforma do governo da Igreja Católica. Antes de mais, que se lembre da ausência de representação de metade da Igreja, denunciada pelo Cardeal Suenens, no Vaticano II: as mulheres. Acabar com a forma actual de sigilo na escolha dos Bispos. A eleição do Papa seria mais representativa se fosse escolhido a partir de representantes das Conferências Episcopais do mundo católico. Os movimentos laicais, na sua diversidade, deveriam dispor de canais de representação. As Congregações Religiosas, femininas e masculinas, não poderiam ficar de fora, dado o seu carisma de carismas na Igreja.

Quaresma III

03.03.2013

Isto, então, é o que eu penso sobre a Justiça de Deus. O meu próprio caminho é todo confiança e amor, e não consigo entender as almas que têm medo de um Amigo tão carinhoso. Às vezes, quando leio livros onde a perfeição é colocada diante de nós com o objectivo obstruído por mil obstáculos, a minha pobre cabeça rapidamente se cansa. Fecho o tratado erudito, que cansa o meu cérebro e seca o meu coração, e volto para as Sagradas Escrituras. Então tudo se torna claro e luminoso — uma só palavra abre horizontes infinitos, a perfeição aparece fácil, e eu vejo que é suficiente reconhecer a nossa insignificância, e como crianças entregarmo-nos nos Braços do Bom Deus.

S. TERESA DO MENINO JESUS, OCD, Cartas para os Seus Irmãos Missionários